Tentar fazer uma avaliação de João Batista pelos modernos padrões de espiritualidade seria o mesmo que tentar medir o sol com uma fita métrica. No Jordão, a multidão ansiosa indagou a respeito do recém-nascido:
— Que virá a ser, pois, este menino?
E a resposta foi:
— Ele será grande diante do Senhor.
Hoje em dia, a palavra “grande” se acha muito desgastada, pois confundimos proeminência com importância. Naquela época, Deus não estava à procura de sacerdotes, nem de pregadores, mas de homens. E havia muitos homens, como hoje, mas eram todos “pequenos” demais. Ele precisava de um grande homem para uma grande missão.
João Batista possuía pelo menos um atributo que o qualificava para o sacerdócio, mas tinha todos os requisitos necessários para tornar-se um profeta. Antes de sua vinda, o povo vivera quatrocentos anos de trevas, sem um raio da luz profética; quatrocentos anos de silêncio, em que não se ouvira o brado: “Assim diz o Senhor”; quatrocentos anos de uma constante deterioração espiritual. E assim Israel, a nação escolhida por Deus, estava imersa em holocaustos, cerimônias e circuncisões, fazendo expiação com rios de sangue de animais, e tendo por mediador uma classe sacerdotal rica e saciada.
Mas o que um exército de sacerdotes não conseguiu fazer em quatrocentos anos, foi feito em seis meses por um homem “enviado por Deus”, moldado por Deus, cheio de Deus e incendiado por Deus, João Batista.
Concordo com E. M. Bounds quando diz que Deus leva vinte anos para formar um pregador. A preparação de João foi feita na divina Universidade do Silêncio. Deus matricula nela todos os seus grandes homens. Embora Cristo tenha feito sua interpelação a Paulo — um fariseu orgulhoso, legalista, de intelecto privilegiado e linhagem invejável — na estrada de Damasco, ele precisou passar três anos na Arábia para se esvaziar de tudo isso, e desaprender o que aprendera, para que finalmente pudesse afirmar: “Deus revelou-se em mim”. Deus pode preencher num minuto o que nós levamos anos para esvaziar. Aleluia!
Jesus disse: “Ide”, mas também ordenou: “Permanecei... até que”. Aquele que resolver passar uma semana fechado num aposento, a pão e água, sem nenhuma leitura a não ser a Bíblia, sem companhia alguma a não ser a do Espírito Santo, ou sofrerá um colapso nervoso ou terá tal experiência com Deus que sua vida e ministério serão revolucionados. Depois disso, como Paulo, ele será conhecido no inferno.
João Batista ficou na divina Escola do Silêncio, o deserto, até o dia em que se manifestou ao povo. E quem poderia estar mais bem preparado para aquela tarefa de despertar de seu sono carnal aquela nação entorpecida, do que aquele profeta queimado de sol, batizado com o fogo e moldado no deserto, e enviado por Deus? Nos olhos, ele trazia a luz de Deus, na voz a autoridade divina e na alma o mesmo ardor de Deus. Quem — pergunto eu — poderia ser maior do que João? É verdade que ele “não fez nenhum sinal”, isto é, não ressuscitou nenhum morto. Mas fez muito mais: ergueu uma nação morta.
E esse profeta vestido de couro, com um ministério de curta duração, era tão ardoroso e sua luz tinha tal brilho, que os que ouviam suas mensagens fervorosas, candentes, iam para casa e passavam noites insones até que sua alma se quebrantava em arrependimento. Entretanto, tinha uma doutrina diferente: sem holocaustos, sem cerimônias, sem circuncisão; tinha uma dieta estranha: sem vinhos, nem banquetes; tinha roupas estranhas: sem filactérios, nem vestes farisaicas.
É verdade, mas João era grande! As grandes águias voam sozinhas; os leões maiores caçam sozinhos; as almas grandiosas vivem sozinhas, a sós com Deus. É muito difícil suportar tal solidão; é impossível apreciá-la, a não ser acompanhado de Deus. Realmente João conseguiu ser grande. Ele foi grande em três aspectos: grande na sua fidelidade ao Pai (preparou-se durante tanto tempo para pregar por tão curto período); grande em sua submissão ao Espírito (andava ou parava de acordo com as orientações dele); grande nas afirmações que fez sobre o Filho (apontando Jesus como “o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo”, apesar de não ter-se avistado com ele antes).
João era uma “Voz”. A maioria dos pregadores não passa de ecos, pois, se prestarmos bem atenção, saberemos dizer quais os livros que andaram lendo, e notaremos que citaram muito pouco do Livro. E hoje, só uma Voz, voz de um profeta enviado do céu para pregar aos pregadores, conseguiria despertar o coração dos homens. Só quem tem coração quebrantado é capaz de levar outros ao quebrantamento. Irmãos, nós temos equipamentos, mas não temos poder; temos ação, mas não unção; barulho, mas não avivamento. Somos dogmáticos, mas não dinâmicos!
Todas as eras têm iniciado com fogo, e todas as vidas, sejam de pregadores ou de prostitutas, vão findar em fogo — o fogo do juízo para alguns, o fogo do inferno para outros. Wesley diz o seguinte em um de seus hinos:
“Salvemos as almas do fogo do inferno,
aliviando-lhes o tormento com o sangue de Cristo”.
Irmãos, temos só uma missão: salvar almas, e, no entanto, elas estão perecendo. Pensemos nisso! Existem milhões, centenas de milhões, talvez milhares de milhões de almas eternas que precisam de Cristo. E sem a vida eterna elas irão perecer. Ah, que vergonha para nós, que horror, que tragédia! “Cristo não desejava que ninguém se perdesse”. Irmãos pregadores, hoje há milhões e milhões de pessoas seguindo para o fogo do inferno, porque nós perdemos o fogo do Espírito!
Esta geração de pregadores é responsável pela atual geração de pecadores. Diante das portas de nossas igrejas passam todos os dias milhares de pessoas que não foram salvas porque ninguém lhes pregou, e ninguém lhes pregou porque ninguém as amou. Dou graças a Deus pelo grande trabalho que é realizado nos países estrangeiros. Contudo é muito estranho que aparentemente tenhamos maior preocupação por aqueles que se encontram do outro lado do mundo, do que com os que moram do outro lado da rua. Apesar de todas as nossas campanhas e nosso evangelismo de massas, o número dos que são salvos se limita a centenas, enquanto que, se cair uma bomba atômica por aqui, irão aos milhares para o inferno.
Não tem fundamento a afirmação feita por alguns de que a pecaminosidade atual não tem paralelo em outra época da História. Jesus disse o seguinte: “Assim como foi nos dias de Noé, será também nos dias do Filho do homem”. A descrição de como foi nos dias de Noé encontra-se em Gênesis 6.5: “Viu o Senhor que a maldade do homem se havia multiplicado na terra, e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração”. Então o mal era total, “todo o desígnio”; era contínuo, “continuamente mau”. Era assim, e assim é. Hoje o pecado está recebendo uma fachada de embelezamento, está sendo popularizado, entrando por nossos ouvidos através dos rádios, pelos nossos olhos através da televisão e das capas de revistas. Os membros de igreja se acham saturados das pregações e cansados dos ensinos que ouvem, e estão saindo dos cultos da mesma forma como entram — sem visão e sem fervor algum. Ó Deus, envia para esta geração dez mil João Batistas para arrancar os curativos que os moralistas e políticos colocaram sobre o pecado das nações!
Assim como Moisés não pôde deixar de notar a sarça que ardia, assim também ninguém vai-se enganar quando vir um homem em chamas. Deus vence um fogo com outro fogo. Quanto mais fogo houver nos púlpitos, menos pessoas haverá no fogo do inferno.
João Batista foi um homem diferente com uma mensagem diferente. Assim como o réu acusado de assassinato empalidece ao ouvir o juiz pronunciar a sentença: “Culpado!” assim também aquele povo ouviu João clamar: “Arrependei-vos!” E esse clamor ecoou nos recessos de sua mente, despertando lembranças, fazendo pesar a consciência e levando-os a buscar o batismo, dominados pelo terror. E após o Pentecostes, a pregação de Pedro, que acabara de receber o batismo de fogo do Espírito, abalou os ouvintes de tal modo que eles clamaram: “Que faremos, irmãos?”
Imaginemos que alguém lhes respondesse: “Assine este cartão de membro! Passe a freqüentar esta igreja regularmente. Dê sempre os dízimos”.
Não! Mil vezes não!
Inspirado pela unção do Espírito, João dizia: “Arrependei-vos!” E eles se arrependeram. Mas arrepender não é simplesmente derramar algumas lágrimas no altar. Também não é ter remorso, nem emoção, nem passar por uma reforma pessoal. Arrepender-se é mudar de idéia com relação a Deus, ao pecado e ao inferno!
As duas maiores forças da natureza são o vento e o fogo, e as duas se uniram no dia de Pentecostes. E aquele abençoado grupo reunido no cenáculo, como o vento e o fogo, se tornou irresistível, incontrolável e imprevisível. E o fogo que ardia neles extinguiu a violência do fogo; dele saíram chamas missionárias, centelhas que incendiaram o coração de mártires, e atearam o fogo do avivamento.
Há cerca de duzentos anos atrás Carlos Wesley cantava:
“Ah, que o fogo sagrado possa começar a arder em mim.
E queime a escória dos desejos vis
E faça os montes ruir”.
E o Dr. Hatch levantou o seguinte clamor:
“Sopra em mim, fôlego divino,
Até que me torne inteiramente teu.
Até que o que há de terreno em mim
Arda com o fogo dos céus”.
O fogo do Espírito Santo destrói, purifica, aquece, atrai e enche de poder.
Existem alguns crentes que não sabem precisar a data em que foram salvos. Mas ainda não conheci ninguém que tenha sido batizado com o Espírito Santo e com fogo que não saiba dizer o momento em que isso aconteceu. São esses homens que abalam os povos e os conquistam para Deus, como Wesley, que nasceu do Espírito, foi cheio do Espírito e viveu sempre no Espírito.
Os automóveis só rodam depois que recebem a centelha da ignição; as pessoas que não se movem nem se comovem são as que não receberam ainda o fogo.
Amados irmãos, a Bíblia fala de uma sentença mais pesada para os pregadores. Para eles haverá “maior juízo” (Tg 3.1). Pode ser até que quando eles estiverem perante o trono do julgamento divino, os pecadores lhes digam:
“Pregador, se o senhor tivesse o fogo do Espírito, eu agora não estaria indo para o fogo do inferno”.
Como Wesley, eu também creio que os crentes precisam experimentar o arrependimento. A promessa do Pai é para você. Então agora, onde quer que esteja, numa missão no estrangeiro, numa casa rica e confortável ou num gabinete pastoral, se estiver sentindo-se quebrantado, pronto a render as armas, ajoelhe-se e faça suas as palavras da seguinte oração:
“Manda, Senhor, o fogo,
Para fortalecer meu coração,
E eu viva para salvar o mundo que está perecendo.
Em teu altar agora deposito
Minha vida, meu ser;
Em sinal de aceitação dessa minha oferta, peço-te,
Envia sobre ela o fogo divino!”
— F. de L. Booth-Tucker.
Hoje temos uma igreja fria, num mundo frio, porque os pregadores são frios. Manda teu fogo, Senhor!
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